(Capa do álbum Deus é mulher - 2018)
“Mulher do fim do mundo. Eu sou, eu vou até o fim cantar”. Elza Soares, cante até o fim! Se você conhece esse ícone da música brasileira sabe do que estamos falando, se não conhece, vamos te apresentar a mulher que respira arte.
Elza Soares nasceu no subúrbio do Rio de Janeiro em meio a Revolução de 1930. Vinda de uma família simples, ela cresceu na favela da Vila Vintém e descobriu a vida musical por influência de seu pai. Um marco que ouvimos sobre Elza, é a história de quando ela tinha 13 anos e botou o vestido da sua mãe - ajustado com alfinetes, para participar do programa de calouros do Ary Barroso. No momento em questão, Ary perguntou-a “Mas de que planeta você veio menina?” e ela respondeu “Do mesmo planeta seu, Seu Ary”, ele curioso disse “Então qual é o meu planeta?” e Elza simplesmente “O planeta fome”.
A participação no programa tinha o objetivo de concorrer ao prêmio em dinheiro e arcar com os custos de seu filho doente, pois com apenas 12 anos, Elza foi obrigada a se casar com um amigo de seu pai e logo engravidou. A cantora teve mais um filho aos 15 anos porém acabou morrendo assim como o primeiro, ao total teve oito filhos ao longo da vida. Depois de um casamento extremamente abusivo, ela ficou viúva com 21 anos de idade, e começou a trabalhar frequentemente até lançar seu primeiro disco em 1960.
Em 1962, Elza foi se apresentar na copa do México e acompanhando a seleção brasileira conheceu Mané Garrincha, com o qual teve um relacionamento inicialmente conturbado pois ele era casado na época. Depois de colocar Garrincha em cheque sobre isso, ele decide ficar com a mulher e isso rende para Elza a canção “Eu sou a outra”. Em seguida, ele desiste da atual esposa e casa-se com a cantora. Como vimos até aqui, a vida de Elza sempre foi cheia de dificuldades e com esse episódio não foi diferente pois ela foi considerada a prostituta que destruiu um casamento.
No período da ditadura, os militares metralharam a casa onde Elza e o marido moravam, então eles exilam-se para a Itália. Em 1972 a cantora retorna ao Brasil e tem mais um filho, seu último, o “Garrinchinha”. Mais uma vez, ela passa por um casamento abusivo onde o alcoolismo de Garrincha é o motor. Acontece o divórcio em 1982, seguido da morte do jogador em 1983 e da morte do filho do casal em 1986. Sofrendo muito e como válvula de escape, Elza se muda para os Estados Unidos e depois de recuperada lança no Brasil seu álbum “Voltei”, em 1988.
Se você já viu Elza Soares se apresentar deve ter percebido que ela faz isso sentada. A cantora sofreu um acidente no final da década de 90, que atingiu a coluna e dificultou seus movimentos do corpo, novamente mais uma obra originou-se: “Do cóccix até o pescoço”.
A artista já foi homenageada de diversas maneiras por sua profunda história de vida. A BBC elegeu-a como a voz do milênio, a cineasta Elizabete Martins Campos dirigiu um documentário musical chamado “My name is now, Elza Soares”, e a escola Mocidade trouxe Elza como tema do samba-enredo no desfile de carnaval deste ano. Mulher, negra, guerreira, Elza e sua voz rouca que canta e encanta, é um símbolo de resistência e aprendizado para todos nós.
Não poderíamos encerrar a história desta mulher sem citar suas obras em detalhes. Explicar “tim tim, por tim tim” suas mais relevantes obras, que ficarão conosco para a eternidade. Começamos então pelo final dos anos 50, Elza Soares fez uma turnê de um ano pela Argentina, juntamente com Mercedes Batista. Onde a primeira música a fazer sucesso da artista foi Se Acaso Você Chegasse. Logo após, mudou toda sua vida para São Paulo, onde se apresentou em teatros e casas noturnas. Após terminar seu segundo LP, A Bossa Negra, Elza foi ao Chile representando o Brasil na Copa do Mundo 1962, construindo seu legado. Já nos anos 70, iniciou uma turnê internacional pelos Estados Unidos e Europa. Sim, isso logo após se exilar do país. Seu sucesso não poderia ficar preso somente no Brasil, já era evidente a quase duas décadas, mas isto foi como uma reafirmação, talvez para si e para o mundo. Ao retornar ao Brasil, Elza teve um período de depressão e desleixo da gravadora que a fez cogitar encerrar a carreira, antes de se revitalizar com a ajuda de Caetano Veloso, que a convidou para gravar com ele Língua em seu álbum de 1984, Velô. E que época…
Em 2000, foi premiada como "Melhor Cantora do Milênio" pela BBC em Londres. Sim, uma artista nacional assim chegando as premiações internacionais. Um dos concertos mais marcantes da década conteve a presença da lenda Soares, Gal Costa, Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Virgínia Rodrigues. No mesmo ano, estreou uma série de shows de vanguarda, no Rio de Janeiro.
Em 2002, o álbum Do Cóccix até o Pescoço, aquele que originou-se após o acidente, garantiu-lhe uma indicação ao Grammy. E sem novidades, o disco foi bem recebido pelos críticos musicais. Dois anos depois, Elza lançou o álbum Vivo Feliz. Não tão bem-sucedido em vendas quanto suas obras anteriores, o álbum continuou a executar o tema de fazer um mix de samba e bossa com música eletrônico e efeitos modernos.
Em 2007, nos Jogos Pan Americanos do Brasil, Elza interpretou o Hino Nacional, no início da cerimônia de abertura do evento e lançou o álbum Beba-me, onde gravou as músicas que marcaram sua carreira. Além de tudo isso, já atuou como puxadora de samba-enredo, tendo passagens pelo Salgueiro, Mocidade entre outros.
Em todos os anos que dividem 2007 de 2015 a artista produziu músicas, cantou e interpretou diversas canções de homenagem e trilhas para minisséries, novelas e filmes. Mas, somente no ano de 2015, lançou o seu novo disco, A Mulher do Fim do Mundo, primeiro álbum em sua carreira só com músicas inéditas. O Pitchfork, um dos sites de música mais importantes do mundo, o elegeu com o título de melhor novo álbum. As canções do disco falam sobre sexo, morte e negritude, e foram compostas pelos paulistas José Miguel Winisk, Rômulo Fróes e Celso Sim. Por fim, em 2018, Elza lançou o álbum Deus é mulher, o jornalista Cleber Facchi, do blog Miojo Indie, define a obra como “Um título forte, talvez provocativo para os mais conservadores, funciona como um poderoso indicativo da poesia política, crua e necessária que invade o novo álbum de estúdio de Elza Soares. Sequência ao material entregue no elogiado A Mulher No Fim do Mundo (2015) – primeiro registro de inéditas da cantora carioca –, o trabalho de 11 faixas amplia significativamente parte do universo detalhado pela artista há três anos. Um desvendar da alma feminina, debates sobre religião, o florescer da sexualidade e violência urbana.” Encerro com a música de número um deste disco, uma mensagem que me remete à força, a força de Elza Soares.
“Mil nações
Moldaram minha cara
Minha voz
Uso pra dizer o que se cala
O meu país
É meu lugar de fala”
Luana Martins e Millena Ricardo
Parabéns!!
ResponderExcluirObrigada!! :)
ExcluirMuito bom!
ResponderExcluirHahahha obrigada Lucas :)
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